Gerenciar os “hormônios”,  é um grande desafio para o corpo e a mente, principalmente durante o puerpério. O ideal seria que todas nós tivéssemos acesso a uma rede de apoio —paga ou não paga — permitindo mais liberdade e tempo hábil para a mulher poder decidir como recuperar sua energia entre as pequenas e raras pausas. O plano de cuidado ideal para uma mãe parte de ter suporte e escuta de pessoas de confiança. E, acredite, faz —absolutamente —toda a diferença no que diz respeito ao seu autocuidado, ao manejo e cuidados ao RN e às adaptações na nova rotina. 

 

Mudanças no corpo da mulher potencializam (e muito) as dificuldades do pós-parto  

O puerpério é um período em que a mulher passa por MUITAS transformações, o corpo busca se reorganizar e há uma queda brusca de hormônios. Também não podemos nos esquecer do processo de descida do leite —apojadura, a eliminação de líquidos e fluidos corpóreos, entre diversas outras transformações que acabam indo para além, muito além… Apenas essas mudanças físicas e as que se somam, na verdade, se multiplicam no maternar, tornam os dias mais sobrecarregados.

Quem já viveu essa fase, sabe que no pós-parto tudo fica no limite —comemos mal (comida fria, café frio), dormimos mal e pouco, e sim, ficamos num turbilhão de sensações nos adaptando a tudo e às mais diversas situações.

 

Mudanças que ocorrem desde a gestação

Saber que outras mulheres passam por esses desafios pode amenizar, mas não facilita em nada a carga física, mental e emocional que cada uma de nós sente. Por isso, meu objetivo não é normalizar as dores do puerpério, e sim abordar mais o tema e compartilhar soluções possíveis.

 

Frouxidão ligamentar + rotina nova de segurar o bebê

Um fator que pode influenciar a frequência de dores no puerpério, é a frouxidão ligamentar, já que, durante a gestação, o corpo da mulher se prepara para o parto liberando hormônios, como a relaxina,  favorecendo a frouxidão ligamentar. Também é muito comum neste período a mulher apresentar inchaço e retenção de líquidos, e muitas vezes, associado ainda a sintomas de compressão nervosa. As consequências no pós-parto, podem envolver o aparecimento de dores devido à falta de estabilidade articular, sobrecarga muscular e ligamentar. Vejo que é cada vez mais comum, mulheres com bebês pequenos nos procurando com síndromes, como D´quervain e Síndrome do Túnel do Carpo.

Para adentrar o tema, a Dra Juliana Satake, especializada em obstetrícia, trouxe dados de 2023 de todos os atendimentos realizados em puérperas na rotina da sua clínica e rankeou as principais disfunções: 

D’ Quervain e Síndrome do túnel do Carpo – Uma das articulações que se sobrecarrega no pós-parto é definitivamente o PUNHO. Pense na rotina de cuidados com o recém-nascido… trocas de fraldas, carregar o bebê, dar banho, praticamente todas as posições exigem força constante de um punho firme e seguro para carregar o bebê. Um estudo super recente investigou o padrão e a causa da dor no punho em mulheres e apontou que 57,5% das mulheres tiveram essa dor após o parto e 84% relataram que a dor persistiu cerca de dois meses após o parto, atrapalhando de forma importante a rotina. 

Tirar e colocar o bebê do moisés, bebê conforto ou berço, esse movimento geralmente é sempre muito rápido e quase automático, mas se repararmos, utilizamos muito o nosso polegar para segurar o bebê pelas axilas. É nesse movimento repetitivo, somado à frouxidão ligamentar, que se expõe o tendão, e predispõe à síndrome de D´Quervain. 

 

O que é?

O nome é chique, mas trata-se de uma síndrome dolorosa. Ela leva a uma lesão aguda do nervo mediano do punho, e é muito comum no pós-parto, também conhecida como “pulso do bebê”. O padrão de dor geralmente é bilateral e o risco de dores no punho é duas vezes maior no caso de mães que amamentam —aleitamento materno. 

 

Uma dor influência em outra

Dra Juliana Satake, ainda relata que em 2023, foram cerca de 35 mulheres referindo esse desconforto, e alerta que um sintoma intimamente associado é a dor na cervical. Segundo a fisioterapeuta, geralmente a mãe fala de uma sensação de dor ou irradiação para cabeça e pescoço. É importante que logo no início dos sintomas, a puérpera procure pela ajuda de uma clínica de fisioterapia especializada (com equipe de ortopedia e obstetrícia que integrem as demandas para tratamento mais assertivo). A questão de postergar o tratamento no puerpério envolve a limitação pela dor afetando não apenas as atividades diárias da mulher, mas o cuidado com o bebê —da amamentação a rotina de troca de fraldas e banho. 

 

Tratamento

O tratamento é medicamentoso e com fisioterapia (analgesia para diminuição da inflamação através de recursos como o laser, drenagem linfática manual em casos de retenção líquida, bandagem e exercícios de fortalecimento para melhora da função). 

Diástase + rotina nova de segurar o bebê + dormir pouco e mal + cansaço + sedentarismo = dor nas costas (lombalgia)

A dor lombar não poderia ficar de fora do nosso ranking! Ela é ainda hoje uma das queixas mais comuns durante a gestação e na maior parte dos casos, se mantém e atrapalha o puerpério! Muitas acabam nos procurando no pós-parto para amenizar contraturas e dores nas costas,  já que as dores acabam se intensificando com a sobrecarga de carregar o bebê e com todas as alterações abruptas da rotina.

 

Sensação de “tudo” solto

“O que vemos na prática aqui ao longo de tantos anos é que as mulheres começam reclamando que há uma sensação de falta de estabilidade e falta de suporte abdominal depois do parto – sensação que está tudo solto ”, e muitas vezes, quando avaliadas, podem apresentar  uma diástase abdominal importante. Nestes casos, sem a estrutura de suporte, os músculos da coluna acabam sobrecarregados e é bem comum a  ocorrência de lombalgia. 

 

Tratamento

Aqui, quero reforçar que antes de falar em tratar essa dor, é sempre possível evitar que ela ocorra!  Vale investir em passar ao menos por uma consulta com sua fisioterapeuta pélvica antes do parto para ser devidamente avaliada e orientada com exercícios específicos. É necessária a ativação adequada dos músculos que compõem a região do core —abdômen, coluna e assoalho pélvico. Através da ativação correta e uma maior sustentação da região lombar não há sobrecarga da coluna. 

 

Prepare-se para o puerpério

Muito se fala de fortalecer as costas na gestação, mas além do fortalecimento, a especialista também recomenda que sejam feitos exercícios de estabilidade, mobilidade e alongamento do corpo de forma mais global. Quando se cuida de uma gestante, é impossível segmentar seu corpo e cuidar de partes separadamente. É preciso olhar e cuidar do todo,  pois as mudanças são integrais.

A atividade física quando bem orientada é terapêutica na gestação —sendo eficaz em prevenir e ajudar não somente nessas alterações e desconfortos comuns que podem, de fato, surgir no puerpério. Mas também traz diversos benefícios para a saúde materna e muitos outros benefícios para o desenvolvimento do próprio bebê. 

Antes de iniciar qualquer atividade física, busque sempre o respaldo de seu obstetra e de uma equipe de saúde especializada em saúde pélvica na gestação. Agende com sua fisioterapeuta pélvica uma consulta antes. 

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Clique aqui e descubra as 3 dicas que não fazer no puerpério.

 

Colaboração: Dra Juliana Satake, especializada em obstetrícia pela Unicamp.

*O conteúdo dessa matéria tem caráter informativo e não substitui a avaliação de Profissionais da Saúde.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do IstoÉ.

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