Em uma medida que busca fortalecer a segurança sanitária no Brasil e proteger a saúde da população, a Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia (SBEM), ao lado de outras 15 entidades representativas da saúde, protocolaram na última sexta-feira (23/8), na Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) uma proposta de regulamentação nacional que visa proibir a fabricação, importação, manipulação, comercialização, distribuição, armazenamento, transporte e propaganda de medicamentos com ação hormonal em tipos farmacológicos, combinações, doses ou vias não registradas junto à Anvisa.

A proposta visa preencher lacunas na legislação atual, garantindo que apenas medicamentos hormonais devidamente registrados, com comprovação científica de eficácia e segurança, possam ser disponibilizados à população. 

“Este movimento surge em resposta à crescente preocupação com o uso inadequado de hormônios, que tem gerado graves riscos à saúde pública, inclusive problemas cardíacos, hepáticos, psiquiátricos e outras complicações associadas”, destaca Paulo Miranda, presidente da SBEM. 

A proposta detalha a necessidade urgente de regulamentar de forma mais rigorosa o mercado de medicamentos hormonais, destacando a importância de um controle mais efetivo sobre as drogas que podem ser produzidas ou comercializadas no país. 

Segundo o documento, a falta de regulamentação específica tem facilitado a circulação de substâncias hormonais que não passaram por estudos rigorosos, colocando em risco a saúde dos brasileiros.

Se aprovada, a regulamentação proposta garantirá que somente medicamentos com ação hormonal devidamente avaliados e aprovados pela Anvisa possam circular no mercado brasileiro. 

“Com essa medida, buscamos reduzir significativamente os casos de efeitos adversos relacionados ao uso inadequado de hormônios, além de promover um ambiente de maior transparência e segurança para a população”, acrescenta Paulo Miranda.

Confira a entrevista com um especialista respondendo algumas dúvidas sobre a segurança de saúde pública

Já se deparou com pacientes apresentando dificuldades e complicações de saúde devido ao uso de hormônios não aprovados pela Anvisa? 

Sim. No atual cenário de saúde, nós, os profissionais das áreas endocrinológica, ginecológica e urológica enfrentamos diariamente esse problema crescente de relevância pública: o uso inadequado de hormônios. As implicações desse uso desregulamentado ocorrem em nossos consultórios, afetando diretamente a qualidade de vida e a segurança dos pacientes.

Existe uma brecha na legislação, por isso a proposta dessa regulamentação, que proíbe hormônios produzidos e comercializados por vias que não foram aprovados pela ANVISA. A grande questão é conscientizar.  

É fundamental conscientizar que esses hormônios são frequentemente utilizados em vias, doses e métodos de administração não recomendados, principalmente quando se trata de implantes manipulados.

No Brasil, o único implante hormonal aprovado pela ANVISA é o Implanon, um anticoncepcional que se diferencia claramente dos produtos manipulados disponíveis no mercado.

 

Quais são os principais riscos à saúde associados ao uso de hormônios não regulamentados?

Os perigos associados ao uso não regulamentado de hormônios são uma questão de crescente preocupação. Frequentemente, tais substâncias são utilizadas fora de um contexto científico, incluindo em implantes, géis transdérmicos e, em certos casos, comprimidos orais. Esses usos irregulares podem ter sérias consequências para a saúde física e mental dos indivíduos.

Entre os efeitos adversos observados, destacam-se alterações psicológicas e neurológicas, como irritabilidade, ansiedade, depressão e até mesmo episódios de psicose. A dependência e a abstinência também são riscos potenciais, influenciando o quadro de instabilidade emocional provocado pelo uso inadequado dessas substâncias.

Do ponto de vista físico, os impactos são igualmente alarmantes. O uso não regulamentado de hormônios pode resultar em mudanças nos níveis de colesterol, e no aumento da gordura visceral, elevando substancialmente o risco de trombose, acidentes vasculares cerebrais e até mesmo morte prematura.

Além disso, problemas como hepatite medicinal, que pode evoluir para danos musculares e bloqueio da função testicular, são consequências graves que podem resultar em infertilidade permanente e impotência sexual em homens.

 

Considerando os riscos associados ao uso de hormônios não regulamentados, qual é a importância de reforçar o controle e a fiscalização desses produtos no mercado brasileiro?

Este problema é tão grave que temos vindo a reforçar este alerta desde o ano passado. Foram 16 sociedades que se uniram para que a ANVISA regulasse essa produção de hormônios em escala industrial, para que esse mau comportamento fosse restringido (para fins estéticos e de performance). E que apenas sejam divulgadas e indicadas formas terapêuticas aprovadas pela ANVISA. Esta falta de dados de segurança exige uma mudança urgente na legislação, porque como disse, todos os dias enfrentamos essa situação de crescente alerta de saúde pública.

O vice-presidente da  SBEM, Neuton Dornelas Gomes, esteve presente no Ministério da Saúde em reunião com o Secretário de Assistência Especializada à Saúde, Adriano Massuda e sua equipe no dia 22 de agosto, juntamente com a presidente da Febrasgo (Federação Brasileira de Ginecologia e Obstetrícia) Maria Celeste Osório e a representante da Abeso  (Associação Brasileira para o Estudo da Obesidade e Síndrome Metabólica) Cristiane Moulin para entregar carta conjunta assinada por 16 sociedades médicas para minimizar um grave problema de saúde pública que vem ocorrendo no país que é o uso de drogas de ação hormonal de forma indiscriminada e abusiva, colocando em risco um número acentuado de brasileiros.

“Nenhuma Sociedade quer tornar indisponível os hormônios, pois os mesmos são fundamentais para as pessoas que realmente têm deficiência. Porém, que sejam drogas autorizadas pela Anvisa em combinações, doses e vias de aplicação regulamentadas pela Agência e não a critério de quem prescreve e/ou manipula.” destaca Neuton Dornelas.

O documento foi entregue no Ministério da Saúde e será encaminhado para análise da Anvisa. As entidades envolvidas no protocolo da proposta estão confiantes de que a nova regulamentação será um marco na proteção à saúde pública no Brasil.

Em colaboração: Dr. Clayton Macedo, presidente do Departamento de Endocrinologia do Esporte e Exercício da Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia (SBEM) e coordenador do Departamento de Atividade Física da Associação Brasileira de Estudos da Obesidade e Síndrome Metabólica (ABESO)

Dr. Paulo Miranda, presidente da Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia (SBEM)

Dr. Neuton Dornelas Gomes, vice-presidente da Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia (SBEM)

*O conteúdo desta matéria tem caráter informativo e não substitui a avaliação de Profissionais da Saúde.

**Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do IstoÉ.