Na evolução da humanidade, desde seus primórdios, com a invenção da roda, o que se buscava era melhorar as condições de sobrevivência. A evolução da agricultura com técnicas de arado e cultivo da terra, formas de armazenar os alimentos e se proteger de possíveis perigos.

Com o passar do tempo, foram os meios de transporte, comunicação e energia que mudaram a maneira como vivemos. Hoje, além de não precisarmos plantar ou caçar, as compras de mercado podem chegar na porta de nossas casas, e muitos perderam até o hábito de ir à feira escolher suas próprias frutas e verduras.

Tudo bem que a ciência e a medicina também evoluíram na mesma proporção, mas algumas doenças continuam sendo um desafio, entre elas o câncer.

Quando pensamos nos benefícios da atividade física para a saúde, a primeira coisa que lembramos é das questões cardiovasculares ou até das doenças metabólicas ligadas à obesidade. Mas sabia que muitos cânceres podem ter sua incidência diminuída só pelo hábito de se praticar atividades físicas regularmente?

E esse pode ser um apelo mais eficaz para convencer as pessoas a serem mais ativas. Na minha rotina de consultório vejo muito mais preocupação com câncer do que com doenças cardiovasculares, por exemplo.

Afinal, quais os cânceres que podem ser positivamente impactados pela atividade física?

Câncer de mama

Existem diversos mecanismos descritos pelos quais a atividade física pode diminuir o risco de câncer de mama, mas o principal está ligado a questões hormonais.

A maioria dos cânceres de mama apresentam receptores para alguns hormônios, principalmente os estrogênios e a progesterona, ou seja, esses hormônios agem nos tumores que apresentam tais receptores, acelerando seu crescimento. Um boa parte dos estrogênios é produzida na gordura através de um processo chamado aromatização. Quanto maior a quantidade de gordura, maior será a produção de estrogênios através desse processo. Estudos mostram que a atividade física pode levar a uma diminuição de 12 a 21% nas chances de desenvolver câncer de mama, já que mulheres fisicamente ativas costumam ter menos gordura corporal, portanto menor produção de estrogênios através da aromatização.

Câncer de endométrio (útero)

O mecanismo aqui é parecido com o do câncer de mama. O endométrio, que é a camada que reveste internamente o útero, também apresenta receptores hormonais. Como já disse antes, quanto mais gordura corporal, mais estrogênio será produzido. Este atua no endométrio aumentando as chances de surgir um câncer. Estudos mostram que mulheres fisicamente ativas apresentam risco até 20% menor, pelos mesmos motivos citados para o câncer de mama.

Câncer de intestino

Aqui também diversos mecanismos são descritos como possíveis fatores protetores, mas o exercício funciona diminuindo fatores de risco como colesterol alto, obesidade e síndrome metabólica. Os estudos mostram uma diminuição de aproximadamente 19% no risco relativo de desenvolver um câncer de intestino para pessoas fisicamente ativas.

Câncer de estômago

No caso do câncer de estômago, que da mesma forma que a grande maioria, tem como principal fator de risco a hereditariedade, a atividade física tem um impacto indireto em fatores comportamentais como dieta, consumo de álcool e tabagismo, com um risco também 19% menor para quem pratica atividades físicas.

Câncer de bexiga

Para o câncer de bexiga a redução do risco relativo chega a 15% para indivíduos fisicamente ativos, sendo maior para praticantes mais frequentes.

Existem evidências científicas de que a prática regular de atividade física também é benéfica para outros tipos de câncer como de rins e esôfago. E mesmo após o diagnóstico, a atividade física é extremamente importante durante o tratamento, desde que liberada pela equipe médica responsável.

Pessoas fisicamente ativas normalmente se alimentam melhor e têm hábitos de vida mais saudáveis, e tudo isso terá um impacto na possibilidade de desenvolver um câncer e no seu prognóstico, além de todos os benefícios já conhecidos para a saúde e longevidade.

 

*O conteúdo dessa matéria tem caráter informativo e não substitui a avaliação de Profissionais da Saúde.

**Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do IstoÉ.

Referências Bibliográficas

Patel AV, Friedenreich CM, Moore SC, Hayes SC, Silver JK, Campbell KL, Winters-Stone K, Gerber LH, George SM, Fulton JE, Denlinger C, Morris GS, Hue T, Schmitz KH, Matthews CE. American College of Sports Medicine Roundtable Report on Physical Activity, Sedentary Behavior, and Cancer Prevention and Control. Med Sci Sports Exerc. 2019 Nov;51(11):2391-2402.
McTiernan A, Friedenreich CM, Katzmarzyk PT, Powell KE, Macko R, Buchner D, Pescatello LS, Bloodgood B, Tennant B, Vaux-Bjerke A, George SM, Troiano RP, Piercy KL; 2018 PHYSICAL ACTIVITY GUIDELINES ADVISORY COMMITTEE*. Physical Activity in Cancer Prevention and Survival: A Systematic Review. Med Sci Sports Exerc. 2019 Jun;51(6):1252-1261.
Romieu II, Amadou A, Chajes V. The Role of Diet, Physical Activity, Body Fatness, and Breastfeeding in Breast Cancer in Young Women: Epidemiological Evidence. Rev Invest Clin. 2017 Jul-Aug;69(4):193-203.
O'Sullivan DE, Sutherland RL, Town S, Chow K, Fan J, Forbes N, Heitman SJ, Hilsden RJ, Brenner DR. Risk Factors for Early-Onset Colorectal Cancer: A Systematic Review and Meta-analysis. Clin Gastroenterol Hepatol. 2022 Jun;20(6):1229-1240.e5.
Machlowska J, Baj J, Sitarz M, Maciejewski R, Sitarz R. Gastric Cancer: Epidemiology, Risk Factors, Classification, Genomic Characteristics and Treatment Strategies. Int J Mol Sci. 2020 Jun 4;21(11):4012.
Friedenreich CM, Ryder-Burbidge C, McNeil J. Physical activity, obesity and sedentary behavior in cancer etiology: epidemiologic evidence and biologic mechanisms. Mol Oncol. 2021 Mar;15(3):790-800.
Brown JC, Winters-Stone K, Lee A, Schmitz KH. Cancer, physical activity, and exercise. Compr Physiol. 2012 Oct;2(4):2775-809.