A quantidade de músculos não é a única determinante da força de uma pessoa. Para que você tenha uma ideia, duas pessoas com músculos igualmente volumosos podem ter diferentes níveis de força, variando até dentro do corpo de uma mesma pessoa! Como assim?  A perna esquerda de alguém pode ser mais forte que a sua perna direita. Essa capacidade de um músculo produzir força por unidade de volume é chamada “qualidade muscular” ou QM. Para entendermos como a qualidade está relacionada à quantidade, vamos primeiro entender como esses dois fatores impactam nossos músculos.

 

Quantidade e qualidade dos músculos

Como são compostos os músculos?

O músculo é composto do tecido contrátil e não contrátil, apresentando fibras musculares dispostas em paralelo com uma grande quantidade de miofibrilas —constituídas por sarcômeros, compostos por actina e miosina que se sobrepõem e dão ao músculo a capacidade de se relaxar ou contrair.

 

O que é qualidade muscular? 

A qualidade muscular é determinada pelas quantidades relativas desses tecidos contráteis e não contráteis. Sua relação é a seguinte: quanto maior a proporção do tecido contrátil de um músculo em relação ao tecido não contrátil, maior a quantidade de força que ele pode produzir e, assim, maior a sua qualidade muscular.

 

Relação entre quantidade e qualidade muscular

O tecido contrátil é constituído por fibras especializadas que permitem ao músculo exercer força, e é tão importante em exercícios aeróbicos, como correr, quanto em exercícios anaeróbicos, como musculação.

O tecido não contrátil, que consiste principalmente de tecido conjuntivo e tecido adiposo (gordura), também é importante para o músculo de diferentes maneiras. O tecido conjuntivo fornece integridade estrutural ao músculo e os depósitos de gordura no interior do músculo podem ser uma fonte de energia. No entanto, quando a gordura se acumula em excesso, aumenta a porcentagem não contrátil do músculo e reduz a qualidade muscular.

Assim, mesmo que o músculo não diminua seu tamanho visivelmente, sua força diminuirá.

Por isso, quanto mais tecido contrátil for constituído em um músculo, mais forte será e maior será a qualidade do músculo

 

Outros fatores que podem estar relacionados com a relação qualidade muscular e força física

Um estudo de Sébastien Barbat-Artigas et al. de 2014, reforça conclusões divergentes na literatura a respeito da relação entre qualidade muscular —definida como força muscular por unidade de massa muscular —e função física. Esses resultados podem ser devido à influência de fatores como idade, obesidade e massa muscular.

Os resultados mostraram que há outros fatores que podem influenciar a relação entre qualidade muscular e função física, como a obesidade e a idade, sugerindo que esses devem ser levados em consideração na interpretação da musculatura. 

Assim, se os níveis de gordura corporal forem altos, a qualidade muscular do músculo será comprometida. O envelhecimento também pode afetar a qualidade dos seus músculos de diferentes maneiras.

Após 10 anos de estudo, Hughes e seus colaboradores relataram que menos de 5% das alterações na força muscular eram atribuíveis a alterações no tamanho do músculo. Eles indicaram um possível envolvimento de fatores neurais que contribuem parcialmente para a dissociação entre massa muscular e função muscular, mas a maior parte dessa dissociação pode ser explicada por fatores específicos do músculo e variações em sua capacidade intrínseca de gerar força, ou seja, sua qualidade muscular.

 

Características da qualidade dos músculos

Embora a qualidade muscular seja geralmente calculada como a razão da força muscular por unidade de quantidade muscular, na realidade ela reflete várias características musculares, como sua arquitetura, sua composição em termos de tipagem de fibras ou seu conteúdo lipídico, quanto sua capacidade dos tecidos conjuntivos para transmitir a força produzida pelos tecidos contráteis, os quais requerem ferramentas e técnicas sofisticadas que não estão necessariamente disponíveis, especialmente em estudos de larga escala.

São essas variações em uma ou mais dessas características da qualidade muscular que podem explicar o motivo que leva indivíduos com massa muscular semelhante à apresentarem não necessariamente uma força muscular semelhante. Por esse motivo, a qualidade muscular está sendo cada vez mais reconhecida como um determinante importante da função muscular. 

Características como tamanho muscular, tipo de fibra, arquitetura, capacidade aeróbica, tecido adiposo intramuscular, fibrose e ativação neuromuscular contribuem potencialmente para a qualidade muscular.

Essas diferenças na qualidade muscular ocorrem não só entre indivíduos, como também entre os mesmos músculos em diferentes lados do corpo. Por exemplo, se a qualidade muscular da perna direita for maior que a da perna esquerda, ela produzirá maior força durante a corrida. Isso pode resultar em sutis diferenças de alinhamento do quadril e pernas que podem reduzir a eficiência da corrida e, com o tempo, aumentar o risco de lesões

Embora a qualidade muscular não reflita necessariamente no seu nível de condicionamento físico, fortes evidências sugerem que equalizar diferenças entre as pernas aumentará o desempenho e reduzirá o risco de lesões.

 

Treinos para melhorar sua qualidade muscular

Apesar de ser difícil de ser mensurada, devido aos cálculos típicos de qualidade muscular envolverem algum tipo de teste de força máxima da musculatura envolvida, bem como uma medida de sua massa muscular ou área transversal usando equipamento eletrônico sofisticado, caro e relativamente inacessível —o ultrassom é uma maneira cada vez mais disponível, conveniente e não invasiva de medir a qualidade muscular mais diretamente —é possível prevenir-se de ter diferentes qualidades musculares em seu próprio corpo e, ainda, melhorar seu treino para pensar mais em qualidade que quantidade.

Para melhorar a qualidade da musculatura, você deve aumentar a força do tecido contrátil, reduzir a quantidade de tecido não contrátil ou fazer as duas coisas simultaneamente por meio do treinamento de força e reduzir o tecido adiposo intramuscular. Foque em treinamentos de força, na velocidade de execução —nada de fazer mil repetições mal feitas, melhor realizar a movimentação com uma carga que consiga controlar o movimento e realizar em uma velocidade lenta —, concentre-se na movimentação —não fique mexendo no celular e realizando a movimentação de qualquer jeito. Da mesma forma, a qualidade do treino importa muito mais que a quantidade.

Executando exercícios da forma correta e com supervisão de profissional da área da saúde, você melhora seu desempenho esportivo, reduz o risco de lesões e aumenta suas atividades diárias e seu estado de saúde, seja você um atleta ou não atleta, idoso ou jovem.

E se você Não está com vontade de treinar? Veja dicas que podem te ajudar, esse outro texto da minha coluna poderá te ajudar!

 

*O conteúdo dessa matéria tem caráter informativo e não substitui a avaliação de Profissionais da Saúde.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do IstoÉ.

Referências Bibliográficas

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