De acordo com uma revisão de literatura publicada pela Revista Brasileira de Ciência e Movimento, realizada por Marco Túlio de Mello e pesquisadores, sobre ritmo circadiano e desempenho físico, a performance depende do seguinte:

  • Temperatura corporal. A temperatura corporal atinge o mínimo valor (36ºC) no período de sono, em torno das 4h da manhã, aumenta durante o dia e atinge seu pico (37.5°C) no final da tarde, por volta das 18h. Durante o exercício, 80% da energia usada nas contrações musculares podem ser dissipadas sob a forma de calor. Assim, o desempenho está relacionado ao horário em que a temperatura corporal atinge seu pico, pois coincide com o pico do consumo de oxigênio, a taxa de ventilação e metabólica, que ocorrem entre 15h e 21h. Com isso, estudos mostram que há relações positivas entre bom desempenho, temperatura corporal mais elevada e vigília subjetiva. E há relações negativas entre bom desempenho, alto nível de cortisol (hormônio estressante) e de melatonina (hormônio que induz o sono, secretado entre 21h e 7h).
  • Frequência cardíaca. Varia durante o dia de 5% a 15%, dependendo de muitos fatores, como sono, postura, nível de atividade física e dieta. Seu pico ocorre por volta das 15h, sendo mais baixa durante a noite.
  • Consumo de oxigênio. O consumo de oxigênio, importantíssimo marcador de desempenho físico, tem seu pico entre 15h e 19h, sendo influenciado pela temperatura corporal.
  • Hormônio do crescimento. O hormônio do crescimento (GH) atinge seu pico durante o sono e depende do nível de atividade física, sendo que ocorre maior liberação em exercícios de intensidades relativas (depende da duração e intensidade).
  • Catecolaminas. As catecolaminas –noradrenalina e adrenalina– influenciam no desempenho pela produção e liberação de calor. Enquanto a noradrenalina aumenta em exercícios de 40 a 60% do consumo máximo de oxigênio (ritmo moderado), os níveis de adrenalina permanecem inalterados até que a intensidade do exercício exceda aproximadamente os 60% do consumo máximo de oxigênio (ritmo forte).
  • O humor e o estado de alerta influenciam no desempenho. Evidências mostram que o estado de alerta, bem-estar, fadiga mínima e humor atingem o pico de tarde e no início da noite. Já as tarefas cognitivas são mais bem realizadas após o almoço.

O que temos que levar em conta, independente do horário, é a constância. Afinal, consistência e disciplina são o match perfeito (não há dias de desânimo que derrubem essas duas palavras). Não adianta treinar todos os dias da semana durante um mês e parar por 6 meses. 

Treino pela manhã

Antes de explicar sobre os benefícios, nada melhor do que já “pagar” o treino logo que acorda, não é mesmo? Além de ter a sensação de meta cumprida, iniciar o treino logo pela manhã faz com que você comece o dia disposto, com energia, cheio de endorfinas e com a sensação de que será produtivo.

Além disso, você não precisa se preocupar em treinar no final da tarde ou à noite, após um dia longo de trabalho, sentindo-se exausto. Treinar pela manhã faz com que tenha mais tempo no final do dia para sociabilizar, relaxar e ter um tempinho de ócio.

Agora vamos aos benefícios comprovados pela literatura que apoiam o treino nas primeiras horas da manhã:

  • Relação com a comida. Um estudo publicado na Medicine and Science in Sports and Exercise avaliou como as mulheres responderam à comida depois de malhar na primeira hora da manhã. Quando os participantes caminharam rapidamente por 45 minutos, foram menos distraídos por fotos de alimentos calóricos em comparação a quando eles deixaram de fazer exercícios.
  • Atividade de vida diária. Nos dias em que os participantes se exercitaram pela manhã, aumentaram sua atividade física ao longo do dia mais do que nos dias em que não se exercitam pela manhã.
  • Metabolismo. Os benefícios adicionais de ir à academia pela manhã incluem um metabolismo aumentado, o que significa que você continuará a queimar calorias ao longo do dia.
  • Sono. O exercício aumenta a frequência cardíaca e a temperatura corporal. Isso significa que as sessões de treino à noite, para algumas pessoas, pode prejudicar sua capacidade de dormir. Um estudo mostrou que malhar às 7h, em comparação com o final da tarde ou à noite, pode ajudar as pessoas a ter um sono de melhor qualidade à noite.

 

Treino no final da tarde ou à noite?

Treinar de noite também tem benefícios práticos. Existem algumas pessoas que, de fato, ficam cansadas após o treino e, quando treinam pela manhã, acabam ficando cansadas o dia todo. Por isso, para essas pessoas, treinar e dormir é uma excelente opção. Tirando isso, treinar de noite faz com que ao longo do dia tenhamos em mente a rotina saudável e, inconscientemente, seguimos uma rotina disciplinada. Agora vamos aos benefícios comprovados pela literatura que apoiam o treino final da tarde ou noite:

  • Desempenho. Sua temperatura corporal aumenta ao longo do dia, otimizando sua função e força muscular, atividade enzimática e resistência para desempenho. Entre 14h e 18h, sua temperatura corporal está no pico máximo. Isso significa que você estará se exercitando durante a janela de tempo em que seu corpo está pronto para treinar.
  • Performance. Além disso, a cinética de consumo de oxigênio é mais rápida à noite, o que significa que você usa seus recursos de forma mais lenta e eficaz do que pela manhã.
  • Tempo de reação. À tarde e à noite, seu tempo de reação é mais rápido, o que é importante para exercícios como o treinamento intervalado de alta intensidade (HIIT) e o treino de velocidade na esteira.
  • Lesão. O final da tarde também é o momento em que sua frequência cardíaca e pressão arterial são mais baixas, o que diminui sua chance de lesão enquanto melhora o desempenho.
  • Sono. Embora alguns possam alertar as pessoas sobre como os exercícios noturnos podem atrapalhar seu sono, um estudo descobriu que aqueles que realizam musculação à noite tiveram um sono de melhor qualidade e dormiram por mais tempo do que aqueles que fizeram os mesmos exercícios pela manhã.

 

O tipo de exercício influencia

Segundo estudos recentes, o horário ideal para realizar exercícios de flexibilidade é entre 12h e 24h. Já os treinos de força muscular, potência anaeróbia e esforços explosivos alcançam seu auge no final da tarde e à noite. Isso pode ser explicado pelo fato de que o desempenho noturno está relacionado a uma maior capacidade de suportar altas intensidades, além de uma correlação com a temperatura corporal mais elevada. 

Você já reparou que os recordes mundiais nos esportes costumam ser quebrados por atletas que competem no início da noite? Isso acontece porque nesse horário a temperatura corporal está no seu pico, o que favorece o desempenho.

Outro estudo interessante mostrou que, ao realizar exercícios com intensidade abaixo do limiar ventilatório, a percepção de esforço é a mesma tanto de manhã quanto à tarde. Porém, acima desse limiar, a taxa de trabalho é percebida como menos cansativa de manhã. Cerca de 20% dessa diferença pode ser atribuída à menor demanda ventilatória 

Vale destacar que a individualidade biológica é muito importante. Ser uma pessoa matutina, vespertina ou intermediária parece não influenciar no desempenho físico. Porém, isso interfere em outros fatores que afetam a performance.

Indivíduos matutinos têm um pico de temperatura corporal mais cedo que os vespertinos, sendo que o alerta nos matutinos diminui após o almoço e também há uma queda do desempenho físico. Já o consumo de oxigênio dos vespertinos parece ser maior à noite.

Novo estudo mostra o melhor horário para pessoas com obesidade e sobrepeso treinarem

Um estudo realizado na Universidade de Sydney, na Austrália, e publicado na Diabetes Care que acompanhou a trajetória de cerca de 30.000 pessoas ao longo de quase 8 anos, mostrou que a realização da maior parte da atividade física diária à noite está associada a maiores benefícios para a saúde de pessoas acometidas com obesidade e sobrepeso.

Os pesquisadores descobriram que os participantes que realizaram a maior parte de sua atividade física aeróbica moderada a vigorosa entre seis horas da tarde (18:00) e meia-noite (00:00) tiveram um menor risco de morte prematura e morte por doença cardiovascular.

A frequência com que as pessoas realizaram atividade física moderada a vigorosa (AFMV) à noite, medida em períodos curtos de até três minutos ou mais, também mostrou ser mais importante do que a quantidade total de atividade física diária.

O exercício não é a única solução para o combate da obesidade, mas essa pesquisa sugere que as pessoas que conseguem planejar a sua rotina de exercícios em determinados momentos do dia podem reduzir os riscos para a saúde.

Esses ensaios clínicos menores mostraram resultados semelhantes, no entanto, a grande escala de dados dos participantes no estudo, o uso de medidas objetivas de atividade física e resultados complexos, como a morte prematura, tornam esse resultados significativos.

Os pesquisadores não acompanharam apenas exercícios estruturados, mas também os se concentraram em monitorar AFMV aeróbica contínua em sessões de 3 minutos ou mais, já que pesquisas anteriores mostram uma forte associação entre esse tipo de atividade, controle da glicemia e redução do risco de doenças cardiovasculares em comparação com sessões mais curtas.

Não foi possível discriminar o tipo de atividade rastreada, podendo ser desde uma caminhada rápida  ou exercícios estruturados, como uma corrida. Mesmo sendo um estudo observacional, as descobertas apoiam a hipótese original dos autores, que é a ideia –baseada em pesquisas anteriores – de que pessoas que vivem com diabetes tipo 2, principalmente desencadeadas pela obesidade ou excesso de peso, e que já são intolerantes à glicose no final da noite, podem ser capazes de compensar a intolerância e complicações associadas realizando atividade física à noite.

Os dados incluíram 29.836 adultos com mais de 40 anos acometidos com obesidade, sendo 2.995 participantes diagnosticados com diabetes tipo 2. Os participantes foram categorizados nos que realizaram atividade física moderada a vigorosa (AFMV) pela manhã, tarde e noite com base em quando realizaram a maior parte de sua AFMV aeróbica, medida por um fitness tracker utilizado continuamente por 24 horas por dia durante 7 dias no início do estudo.

A equipe então vinculou os dados de saúde para acompanhar a trajetória de saúde dos participantes durante 7,9 anos. Durante este período registaram 1.425 mortes, 3.980 problemas cardiovasculares e 2.162 eventos de disfunção microvascular.

Os investigadores levaram em conta diferenças como idade, sexo, tabagismo, consumo de álcool, consumo de frutas e vegetais, tempo sedentário, AFMV total, escolaridade, uso de medicamentos e duração do sono. Eles também excluíram participantes com doenças cardiovasculares e câncer pré-existentes.

Embora seja necessário realizar mais pesquisas para estabelecer ligações causais, esse estudo sugere que o momento da atividade física pode ser uma parte importante das recomendações para o futuro controle da obesidade e do diabetes tipo 2, e dos cuidados de saúde preventivos em geral.

 

*O conteúdo dessa matéria tem caráter informativo e não substitui a avaliação de Profissionais da Saúde.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do IstoÉ.

Referências Bibliográficas