Hoje, quero falar sobre a cannabis medicinal e a importância de estudar mais sobre esta planta e os benefícios do seu tratamento para pessoas com deficiência.

 

Benefícios terapêuticos da cannabis medicinal

O interesse pelo uso de cannabis medicinal tem crescido exponencialmente devido aos inúmeros estudos científicos que demonstram seus benefícios terapêuticos

Para pessoas com deficiência, a cannabis medicinal tem se mostrado eficaz no tratamento de diversas condições, como espasticidade em pacientes com esclerose múltipla, dor crônica, epilepsia refratária, entre outras. 

De acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), cerca de 1 bilhão de pessoas vivem com alguma forma de deficiência, e muitas delas podem se beneficiar dos efeitos terapêuticos da cannabis.

 

A cannabis medicinal pelo mundo

Estatísticas recentes mostram que o uso de cannabis medicinal tem aumentado globalmente. Nos Estados Unidos, por exemplo, mais de 30 estados já legalizaram o uso medicinal da cannabis, e estima-se que mais de 3 milhões de americanos utilizem a planta para fins terapêuticos. No Canadá, onde a cannabis medicinal é legal desde 2001, o número de pacientes registrados ultrapassa os 350 mil.

No Brasil, o cenário também está mudando. A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA) regulamentou a importação de produtos à base de cannabis para uso medicinal em 2015, e desde então, o número de pacientes que utilizam esses produtos tem crescido significativamente. Em 2019, a ANVISA aprovou a regulamentação para a fabricação e venda de produtos de cannabis medicinal no país, o que facilitou ainda mais o acesso para os pacientes.

Pesquisas ao redor do mundo continuam a explorar os potenciais benefícios da cannabis medicinal. Estudos clínicos estão em andamento para avaliar sua eficácia em uma variedade de condições, incluindo transtornos de ansiedade, autismo, Parkinson e Alzheimer

No Brasil, instituições como a Universidade de São Paulo (USP) e a Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) estão na vanguarda das pesquisas sobre o uso terapêutico da cannabis. Pelos estudos atuais, os benefícios para pessoas com deficiência são vários, dentre os principais estão:

Esclerose Múltipla (EM).  A cannabis medicinal tem se mostrado eficaz na redução da espasticidade muscular, aliviando a dor neuropática e melhorando a qualidade do sono.

Epilepsia refratária. O canabidiol (CBD) pode reduzir significativamente a frequência e a intensidade das crises epilépticas em pacientes que não respondem a tratamentos convencionais.

Paralisia cerebral. A cannabis medicinal pode ajudar a reduzir a espasticidade, aliviar a dor e melhorar a mobilidade.

Autismo. O CBD tem potencial na redução da irritabilidade, agressividade e ansiedade, melhorando a interação social e a qualidade de vida.

Doença de Parkinson: Pode ajudar a reduzir os tremores e a rigidez muscular, além de melhorar a qualidade do sono.

Fibromialgia. Pode aliviar a dor crônica, reduzir a fadiga e melhorar o humor.

Lesão medular: A cannabis medicinal pode ajudar a reduzir a espasticidade e a dor neuropática, melhorando a qualidade do sono.

Doença de Alzheimer: Pode ajudar a reduzir a agitação, melhorar o apetite e tem potencial neuroprotetor.

Dor crônica. Eficaz no alívio da dor, reduzindo a necessidade de opioides e melhorando a qualidade de vida dos pacientes.

Apesar dos avanços científicos e regulamentares, o tratamento com Cannabis Medicinal ainda enfrenta barreiras significativas de preconceito no Brasil. Muitos ainda associam a cannabis exclusivamente ao uso recreativo e ilegal, o que dificulta a aceitação de seu potencial terapêutico. Esse estigma pode levar à desinformação e resistência tanto por parte de profissionais de saúde quanto da sociedade em geral, prejudicando pacientes que poderiam se beneficiar desse tratamento.

 

Como conseguir acesso ao tratamento?

Para conseguir acesso ao tratamento com cannabis medicinal no Brasil, os pacientes precisam seguir alguns passos importantes. Primeiramente, é necessário obter uma prescrição médica de um profissional de saúde qualificado. Com a prescrição em mãos, o paciente pode solicitar à ANVISA a autorização para importar produtos à base de cannabis. Desde 2019, também é possível adquirir produtos fabricados no Brasil, regulamentados pela ANVISA, em farmácias autorizadas. 

Em casos específicos, pacientes podem recorrer a ações judiciais para garantir o acesso ao tratamento, especialmente quando enfrentam dificuldades financeiras para arcar com os custos dos medicamentos importados.

Além disso, o SUS Paulista, de forma pioneira, sancionou a Lei 17.618/2023, instituindo a política estadual de fornecimento gratuito de medicamentos à base de canabidiol para pacientes diagnosticados com dois tipos de epilepsia grave, as síndromes de Dravet e Lennox-Gastaut, e com esclerose tuberosa, doença que provoca o aparecimento de tumores pelo corpo nas unidades de Saúde Pública estadual e na iniciativa privada conveniada ao Sistema Único de Saúde (SUS). 

A norma contribuiu para democratizar o acesso ao medicamento, que, por possuir alto custo, prejudicava o tratamento de algumas doenças da população mais carente de recursos financeiros. A lei também prevê a capacitação de médicos e gestores por meio de cursos, palestras, fóruns e outras iniciativas público-privadas, especialmente com entidades sem fins lucrativos.

A cannabis medicinal pode melhorar a qualidade de vida de pessoas com deficiência, oferecendo alívio para condições que muitas vezes são refratárias aos tratamentos convencionais. Onde a cannabis é frequentemente vista como uma ameaça, para muitas pessoas com deficiência, ela representa uma esperança, uma possibilidade de viver com menos dor, mais mobilidade e dignidade.

Que continuemos a promover a educação, a pesquisa e o diálogo aberto sobre este tema. Somente assim poderemos garantir que todos os pacientes tenham acesso aos tratamentos que realmente necessitam, transformando preconceitos em compreensão e resistência em aceitação. A cannabis, que para alguns pode parecer um vilão, tem o potencial de ser um verdadeiro salvador para muitos que lutam diariamente contra suas limitações.

 

*O conteúdo desta matéria tem caráter informativo e não substitui a avaliação de Profissionais da Saúde.

**Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do IstoÉ.

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