Sempre que os profissionais vão fazer alguma análise nutricional com o paciente, questionam: “quais alimentos você não gosta? Tem alguma restrição? E quais alimentos você prefere?”

É natural que alguns tenham restrições a algumas frutas, outros a legumes, outros com texturas e assim vai. Algumas pessoas têm aversão a certos tipos de alimentos por algum trauma ou mesmo por conta de algum contexto de vida, ou por preferências alimentares relacionadas a hábitos culturais —estudos apontam que diferenças culturais influenciam o quanto as pessoas apreciam a aparência, o aroma, o sabor e a textura de diferentes alimentos.

Mas não é só isso. Dados recentes sugerem que nossa genética pode ter uma influência muito grande sobre os alimentos que gostamos ou não. Pesquisadores analisaram como mais de 150.000 participantes classificaram suas preferências por 139 alimentos e bebidas diferentes usando uma escala de nove pontos. Em seguida, os estudiosos analisaram as informações genéticas dos participantes e os resultados de seus questionários de preferência alimentar para ver se conseguiam identificar alguma conexão.

Foram encontradas 1.401 variações genéticas, muitas das quais relacionadas a certos traços de preferência alimentar (ou por um alimento específico ou por grupos de alimentos). Usando essas informações, os pesquisadores classificaram os alimentos em três categorias. Essas categorias são elas altamente palatável —alimentos calóricos e doces —, de baixo teor calórico —legumes, vegetais ou grãos —, e adquirido —apreendidos ao longo da vida, como álcool, café sem açúcar, vegetais com muitos temperos.

Quando os pesquisadores analisaram como as variações genéticas estavam ligadas à saúde, encontraram uma relação entre as categorias de preferência e certos traços de saúde. Os resultados foram:

As pessoas que eram mais propensas a escolher alimentos altamente palatáveis carregavam variantes genéticas ligadas a um maior risco de obesidade e níveis mais baixos de atividade.

As pessoas que gostavam de alimentos de sabor mais forte tinham o colesterol mais baixo do que as pessoas que não tinham preferência por esses sabores e este grupo também foi mais propenso a ter uma maior ingestão de álcool. A preferência alimentar de baixo teor calórico foi associada ao aumento da atividade física.

Quando se tratava de analisar alimentos e grupos de alimentos específicos, os estudiosos descobriram que nem todos carregavam um gene para gostar de todos os alimentos em uma categoria. Por exemplo, as pessoas que gostavam de legumes cozidos não necessariamente gostavam de salada.

Entretanto, exames de ressonância magnética mostraram que a preferência por alimentos mais calóricos podem estar ligadas a uma parte do cérebro envolvida no processamento do prazer, o que sugere que o gosto pela comida é mais influenciado pela biologia do que pelo comportamento. 

Embora os receptores de sabor desempenhem um papel importante sobre quais alimentos você gosta, é, na verdade, o que acontece em seu cérebro que impulsiona o que os estudiosos observaram no estudo, sendo que a principal divisão de preferências não é entre alimentos salgados e doces, mas sim entre alimentos altamente prazerosos e altamente calóricos, e aqueles para os quais o gosto precisa ser aprendido — essa diferença se reflete nas regiões do cérebro envolvidas em seu gosto e aponta fortemente para um mecanismos biológicos subjacentes.

Resultados de um outro estudo realizado pela Sociedade Americana de Nutrição identificaram variantes genéticas para cinco sabores -amargo, doce, umami, salgado e azedo. Os pesquisadores criaram uma “pontuação de gosto poligênico” para determinar o nível de percepção de cada sabor, sendo que uma pontuação mais alta equivale a uma sensação mais forte desse sabor.

Descobriram que uma alta pontuação de sabor amargo estava associada ao consumo de menos alimentos com sabor amargo, como grãos integrais, álcool e vegetais crucíferos (ou seja, brócolis, couve, rúcula). No entanto, os pesquisadores não mediram se uma pontuação mais alta em um determinado sabor representa aversão. Em teoria, se alguém não gosta de vegetais amargos, um nutricionista pode sugerir alternativas mais doces, como abóbora e milho, por exemplo.

Embora seja verdade que fatores modificáveis e fatores externos podem não ter um impacto tão grande, para muitas pessoas, as preferências alimentares remontam à infância. Estudos têm demonstrado que existem intervenções específicas que podem estimular as crianças a experimentarem diferentes alimentos, como a frequência de exposição, observação e aprendizado.

A genética pode desempenhar um papel maior em suas preferências alimentares do que você pensa. Embora você não possa mudar seus genes ou suas papilas gustativas, aceitar seus gostos e desgostos alimentares e trabalhar com eles junto com auxílio profissional, em vez de contra eles, pode ajudá-lo a criar um plano alimentar nutritivo que você goste.

 

*O conteúdo dessa matéria tem caráter informativo e não substitui a avaliação de Profissionais da Saúde.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do IstoÉ.

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