Nosso cérebro possui um sistema muito bem regulado que gera um ciclo de sono alternado com vigília. Esse sistema é o responsável por gerar uma dominância da vigília por cerca de 16 horas a cada dia (isto é, ⅔ do dia), seguido por sono por cerca de 8 horas (último terço do dia).
Quanto sono eu preciso por noite?
Essa pergunta deve ter uma resposta necessariamente individualizada pois não há uma quantidade de sono precisa que sirva a todos os seres humanos, ainda que a maior parte dos adultos precise de 6 a 8 horas por noite. Algumas pessoas precisam de menos que 6 horas, e outras chegam a precisar de 10 horas por noite. Essa característica pessoal tem uma grande determinação genética, e não é algo que possa ser modificado por treinamento ou força de vontade, ainda que essa necessidade varie ao longo da vida. Muitas pessoas acreditam que precisam necessariamente dormir toda noite 8 horas de sono, por exemplo. Em geral, não é bem assim e ter essa ideia fixa pode inclusive contribuir negativamente para a perpetuação da insônia.
Nosso organismo tem “relógios” biológicos muito bem regulados. Esse “relógio” tem ciclos de aproximadamente, mas não exatamente, 24 horas, e envolve diversos processos orgânicos, como digestão, temperatura corporal, padrão de sono e de vigília, tudo isso regido pelo sol. É importante entender esse relógio intrincado para reconhecermos o óbvio: vai ser complicado brigarmos com essas tendências inatas. É possível que, diante de uma vida sempre corrida, a gente se esqueça de que nosso corpo é regido por um ritmo estável e bem articulado. Muitas vezes tentamos exercer mudança nesse ritmo com café, álcool e outras substâncias. Cedo ou tarde, essas tentativas acabam dando errado, é importante que você saiba!
Agora que você já aprendeu que precisa respeitar esse relógio delicado, vou te explicar como é a arquitetura do nosso sono
Inicialmente, o processo de adormecimento envolve um breve período de vigília relaxada, com pensamentos à deriva. Em seguida, inicia-se a fase 1 do sono, com o corpo relaxado e redução de frequências cardíaca e respiratória, assim como diminuição da temperatura corpórea e lentificação de ondas cerebrais, ainda que se trate de um sono superficial, do qual facilmente se desperta.
Rapidamente, após alguns minutos na fase 1, nosso sono entra em fase 2. Nesta fase, o sono é pouco mais profundo que o sono de fase 1, mas ainda leve, com um padrão próprio de ondas cerebrais. Depois de 30 a 40 minutos na fase 2, nosso sono entra por fim no sono profundo, a fase 3. Essa fase tem ondas cerebrais muito lentas e é nelas que a atividade fisiológica do nosso organismo atinge os menores níveis de todo o dia, e é fundamental para que a gente se sinta de fato repousado ao acordar pela manhã.
O sono retorna a fase 2 após aproximadamente 45 minutos na fase 3, e em seguida inicia-se uma fase caracterizada pelo movimento rápido de olhos, daí ela ser chamada de Sono-REM (rapid-eye movement). Esta é a fase do sono em que ocorre a maior parte dos nossos sonhos. Nela, aspectos fisiológicos como a frequência cardíaca acompanham nossos sonhos, ainda que nossa musculatura esteja paralisada (até para não atuarmos nossos sonhos, claro), ou seja, temos uma mente ativa, mas um corpo inativo.
Esse ciclo de sono, passando por cada fase, dura aproximadamente 90-110 minutos e ocorre sucessivas vezes ao longo de uma noite. No início da noite, nos primeiros desses ciclos, os períodos de sono profundo são mais longos, enquanto os períodos de sono REM são mais curtos. Isso ocorre para que, diante da privação de sono, a gente não perca preciosas horas de sono profundo. Isso já nos dá uma dica sobre a importância do sono profundo. É ao perdê-lo que sofremos consequências mais intensas durante o dia.
Ao longo da noite, as fases de sono profundo se tornam mais curtas, e as de sono REM, a fase dos sonhos, mais longas. Justamente por isso é mais provável que nos lembremos de um sonho ao ser acordados ao fim da noite de sono do que no início dela: as últimas horas de sono tem mais sono REM. Na segunda metade da noite é mais comum também que haja despertares dos quais nos lembramos (vários podem ocorrer sem que a gente saiba). Em geral, nos lembramos de até três despertares por noite e, em situação normal, voltamos a adormecer no máximo poucos minutos após cada um deles.
Diante dessa complexidade de depender de muitas horas de sono todos os dias, é natural que surja a pergunta: por que dormimos?
O sono profundo, por exemplo, é uma ocasião de repouso não somente do nosso sistema nervoso central, mas também de todo o corpo. Isso permite o restauro dos nossos músculos, do nosso sistema imune e homeostase de neurotransmissores, elementos da química cerebral muito importantes para regulação emocional e de apetite. Ainda, o sono é fundamental para a consolidação de diversos tipos de memória, inclusive a memória dos fatos cotidianos, do aprendizado de novas tarefas e do processamento das nossas emoções.
Em outras palavras, nosso sono é bastante complexo e tem uma arquitetura própria. Não se trata de simplesmente não estar acordado. Dormir é um mecanismo preciso do nosso sistema nervoso central. O sono é o processo pelo qual nosso cérebro e nosso corpo restauram seu funcionamento eficiente. Não somente a ausência de vigília.
Na próxima coluna explicarei como nosso corpo regula quando e quanto tempo dormimos e quanto tempo ficamos acordados. Fique ligado!
*O conteúdo dessa matéria tem caráter informativo e não substitui a avaliação de Profissionais da Saúde.
** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do IstoÉ.
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