Achei importante falar dessa doença aqui, primeiro por tratar-se de uma doença e não de uma queixa estética, como muitos ainda acham. A acne é uma doença crônica de causa multifatorial, que envolve em sua fisiopatologia fatores genéticos, hormonais, alteração no microbioma da pele, alteração na composição do sebo, inflamação e alteração na qualidade da hidratação da pele, dentre outros fatores.

Até a década de 40, não havia tratamento efetivo para a Acne. Aguardava-se a cura espontânea ou prescreviam-se as poucas opções existentes na época, como enxofre, resorcina –uso e adoro até hoje — e tratamentos sistêmicos que não eram eficazes e que causavam sérios danos à saúde do indivíduo. Acredito que por esse motivo, muitos dos nossos pais e avós vivem ainda essa realidade, a realidade de que a acne é algo estético que se deve aguardar seu curso natural e que cura-se espontaneamente.

Atualmente a realidade e os dados que conhecemos mostram para nós que a acne é uma doença que deve ser encarada de frente. Os indivíduos com acne têm muito mais transtornos de ansiedade, três vezes mais depressão, são frequentemente relacionados com baixa autoestima e pasmem, ao maior risco de suicídio. O mais interessante disso tudo é que, para ocorrerem todos esses transtornos psicológicos, a acne não precisa ser grave como muitos pensam. O grau de acne e seu impacto emocional não são diretamente proporcionais, mas então por que tantas pessoas ainda tratam a acne como um problema meramente estético?

Hoje há um consenso entre os maiores experts quando o assunto é acne: de que a sempre deve ser tratada o mais precocemente possível, independentemente da idade da pessoa, a fim de evitar a evolução para as formas inflamatórias, resultando em cicatrizes e causando sérias repercussões psicossociais, com impacto negativo na qualidade de vida desses indivíduos.

Por volta dos 8 anos de idade, ocorre a reativação da glândula sebácea nos indivíduos e, consequentemente, uma a cascata de ativação da acne em pessoas predispostas geneticamente, ou seja, a pessoa que tem o pai ou mãe que tiveram acne na adolescência, suas chances de desenvolvimento aumentam. Começa a ocorrer então, por aumento dos hormônios masculinos, aumento da produção de sebo e mudanças na qualidade do sebo, levando a uma maior proliferação de alguns tipos de bactérias na pele e também formação dos cravos.

A acne conta com componentes hormonais muito bem estabelecidos, mas nem todas as vezes podemos identificar com alterações nos exames laboratoriais. Assim, devemos entender que o tratamento vai muito além do uso de “creminhos”.

Por ter uma alteração na qualidade da hidratação da pele dos pacientes, não podemos ressecar ainda mais essa pele com produtos ricos em álcool, cremes a base de gel, tônicos adstringentes e mais ácidos, certo?

E se a formação de cicatrizes, que tem impacto na vida adulta dos pacientes, não é diretamente proporcional ao grau de gravidade da acne, por que é que então esperamos as múltiplas cicatrizes ou o impacto psicológico acontecer diante dos nossos olhos para tomar uma atitude e procurar um médico?

Vamos lá! Vou explicar para vocês por onde começar. A primeira atitude que o paciente deve tomar é agendar um dermatologista, tanto homens quanto mulheres –lembrando que as meninas devem agendar também um médico ginecologista.

A partir de uma investigação laboratorial inicial com exames de sangue e de imagem, será possível afastar outras doenças, como a síndrome dos ovários policísticos, onde a acne também pode aparecer como um dos sintomas.

O tratamento deve ser acompanhado de perto, sendo que a higienização deve acontecer com sabonetes suaves e não com aqueles que removam a oleosidade de forma excessiva. A pele acneica deve ser hidratada e o uso de ácidos deve ser introduzido lentamente, havendo um acompanhado de perto para controle dos efeitos colaterais que irão surgir –como vermelhidão, irritabilidade, sensibilização, descamação etc. A escolha do protetor solar deve harmonizar com todos acima e, o mais importante, ser agradável para o paciente, para que faça parte da sua rotina, pois a pele fica mais suscetível a manchas com o uso dos ácidos no tratamento.

Mas como eu disse de início, o tratamento vai muito além dos creminhos. Com frequência, nosso receituário contém drogas antiandrogênicas para auxiliar na redução da oleosidade, antibióticos sistêmicos para erradicar a bactéria causadora da acne, pílulas anticoncepcionais, corticoides orais, sensibilizantes de insulina e, em muitos casos, lançamos mão da isotretinoína oral.

A isotretinoína oral é uma droga considerada segura hoje em dia e é considerada a única droga que possibilita a cura ou a remissão prolongada da acne. Utilizada desde 1982 aqui no Brasil, é considerada o único tratamento capaz de proporcionar como monoterapia a remissão prolongada ou a cura em até 80% dos casos dos pacientes em um único ciclo de tratamento.

Sobre o uso de isotretinoína oral e o risco de depressão, após revisão de alguns estudos, diversos autores concluíram que não havia evidências de que o uso de isotretinoína pudesse aumentar o risco de depressão, suicídio ou outros distúrbios psiquiátricos. Ao contrário, é bem conhecida a melhora significativa de várias funções psicológicas, inclusive dos sintomas depressivos em adolescentes, após o tratamento da acne pela isotretinoína oral.

A acne é uma doença de curso crônico e deve ser acompanhada de perto por um médico. As recorrências podem ocorrer, levando ao quadro em remissão e aparecer somente na vida adulta ou nunca mais. É importante saber que a acne é uma doença que requer tratamento precoce e que tem alto impacto psicossocial.

Referências Bibliográficas

Sampaio, S. de A. P., & Bagatin, E. (2008). Experiência de 65 anos no tratamento da acne e de 26 anos com isotretinoína oral. Anais Brasileiros de Dermatologia, 83(4), 361–367. doi:10.1590/s0365-05962008000400012. 10.1590/S0365-05962008000400012