Nesta conversa, Dr. Ogawa esclarece uma variedade de aspectos sobre a rinite, desafiando a noção comum de que todas as rinites são alérgicas. Com uma abordagem clara e exemplos do cotidiano, ele ilustra a diversidade de causas e tipos desta condição, ao mesmo tempo em que descreve os sintomas distintos, métodos de diagnóstico, tratamentos eficazes e estratégias de prevenção para a rinite alérgica. Através de sua ampla experiência e conhecimento, Dr. Ogawa também explora a interação da rinite com outras doenças respiratórias e seu impacto no dia a dia dos pacientes, oferecendo uma perspectiva abrangente e prática que busca melhorar a qualidade de vida de quem sofre com essa condição tão comum.

 

Dr. Ogawa, como você definiria a rinite? Todas as rinites são alérgicas? 

“Talvez o leitor seja familiarizado com a expressão: ‘tenho todas as ITEs, faringite, otite, rinite…’. O ‘ITE’ significa inflamação. Logo, a rinite significa inflamação do nariz, mais precisamente da parte interna do nariz, da mucosa do nariz. E essa inflamação pode ter muitas causas. Todos nós associamos uma rinite a rinite alérgica, mas existem muitas outras causas, além da questão da alergia. Vou dar três exemplos: 

1) Sabe quando você está resfriado e o seu nariz está trancado e escorrendo? Você está com rinite causada por vírus. 

2) Já aconteceu do seu nariz começar a escorrer enquanto você se alimenta? Você está com rinite gustatória! 

3) Alguma vez você chegou num lugar bem frio e o seu nariz começou a escorrer? É a rinite vasomotora, uma resposta imediata a um agressor externo (aqui no caso, o choque térmico).

Se você pensou: nossa, mas eu achava que tinha só a rinite alérgica, tem tudo isso ainda para atrapalhar o meu nariz? E a resposta é sim e não. ‘Não’, porque não seria possível ter todas. E se você pensou que isso seria possível no seu caso, pois o seu nariz é muito ruim, não, você não tem todas, apenas está sem o tratamento adequado, pois bastaria um tipo de rinite para causar bastante incômodo. E ‘sim’, porque é muito comum apresentarmos mais de um tipo de rinite”.

 

Quais são as causas mais comuns de rinite alérgica?

“A alergia nasal funciona da seguinte forma: ao inspirar, o nariz entra em contato com diversas partículas do ar. Algumas partículas vão desencadear uma resposta do nosso sistema de defesa e vai armazenar esses anticorpos quando o corpo entrar em contato novamente com essa partícula. Essa partícula capaz de produzir esse tipo específico de anticorpo recebe o nome de aeroalérgeno. Existem muitos aeroalérgenos, dos quais os mais famosos são os ácaros, os fungos, os pelos de animais e o pólen. O mais comum de todos é o ácaro. Ele é um microorganismo da mesma família do piolho. Com a importante diferença que eles possuem menos de 1mm, não 1cm. São menores que 1mm, ou seja, são invisíveis ao olho nu. Quando você bate no seu travesseiro ou quando o seu filho pula na cama, muitos ácaros ficam em suspensão no ar, sendo inalados para dentro de forma silenciosa, pois são invisíveis aos nossos olhos. O ácaro se alimenta dos nossos restos epiteliais: descamação da nossa pele, cabelo, pelos de animais e unhas. O maior acúmulo de ácaros acontecerá onde ele puder se alimentar mais, logo estarão concentrados nos tapetes, travesseiros, cama e no sofá da sua casa”.

 

Poderia descrever os sintomas característicos da rinite alérgica?

“É muito fácil identificar a pessoa com rinite! De repente, aquele conhecido dá 5 espirros em sequência, do nada! Cômico se não fosse trágico. Fora os espirros, o paciente com rinite têm que andar com lenços para assoar o nariz. Um detalhe é muito importante: após a exposição ao aeroalérgeno, o paciente com rinite demora no mínimo uns 30 minutos para apresentar os primeiros sintomas. Tente se recordar que após o contato do nariz com o aeroalérgeno, o nosso sistema de defesa precisa recrutar todos os anticorpos para então ocorrer toda a cascata de eventos da rinite. Se você apresenta os sintomas da rinite imediatamente ao chegar em algum local, provavelmente trata-se de rinite vasomotora”!

 

Como é feito o diagnóstico de rinite alérgica?

“O diagnóstico é clínico e, mesmo sem exames, o tratamento pode ser iniciado. Naqueles casos em que houve uma resposta não satisfatória ao tratamento inicial, é realizada a complementação do diagnóstico com “Prick test” ou com o “RAST”. O prick test é o teste da pele, com a inoculação dos aeroalérgenos na pele do antebraço. O RAST é o exame de sangue para a detecção dos anticorpos específicos contra os aeroalérgenos. Tradicionalmente, o prick test é o exame de escolha”.

 

 Existem fatores de risco específicos para o desenvolvimento de rinite alérgica?

“A rinite alérgica é genética. Seu filho provavelmente puxou a rinite de algum dos pais. Existe uma cobrança muito grande nos pais quando o seu filho possui rinite, culpam-se por não terem deixado a casa limpa. Isso é um grande erro, pois o contato com o aeroalérgeno pode vir de vários lugares e as crianças são mais susceptíveis a se contaminar com resfriados e gripes, que causam sintomas nasais”.

 

Quais são as opções de tratamento mais eficazes para rinite alérgica?

“Uma vez feito o diagnóstico da rinite alérgica, orienta-se o controle do ambiente (evitar o aeroalérgeno diagnosticado no prick test) e inicia-se o tratamento medicamentoso. O tratamento medicamentoso depende do grau da rinite. O médico fará o diagnóstico e a gravidade do quadro para iniciar o tratamento. Diferentemente do que muitos pensam, o tratamento medicamentoso evoluiu muito! Os antialérgicos mais recentes (2ª geração) não dão mais sono em comparação aos antialérgicos antigos (1ª geração). Os estudos de segurança com corticosteróides nasais mostram que eles não são absorvidos pelo corpo, permitindo um tratamento prolongado nos casos mais difíceis e sem efeitos no corpo”.

 

Existem estratégias eficazes para prevenir os sintomas da rinite alérgica?

“O combate ao ácaro é complexo e vai exigir dedicação para que se evite o contato com o ele ou a sua proliferação. O ácaro se multiplica com mais facilidade em ambientes úmidos e se alimenta dos restos epiteliais (pele, unha e pelos). Na estratégia do combate à multiplicação do ácaro, você teria que evitar o uso de umidificadores ao lado da cama (opte por colocá-lo mais afastado da cama), você teria que evitar que os umidificadores ficassem ligados por muito tempo (máximo de 2 a 4 horas no mesmo cômodo) e colocar capas que “envelopam” o travesseiro, a cama ou o cobertor. Dê preferência para as capas intituladas antiácaro. As capas devem ser higienizadas a cada 7 dias. Na estratégia do combate ao contato com o ácaro, você teria que evitar o uso de vassoura e até do aspirador (o filtro tradicional permite a passagem do milimétrico ácaro) na sua casa, dando preferência ao uso de panos levemente úmidos para não colocar os ácaros em suspensão. Por último, caso a gente falhe no combate da multiplicação ou do contato com o ácaro, ainda nos resta eliminá-los através da lavagem nasal com soro fisiológico. O uso do soro fisiológico nasal deve ser feito de forma responsável, pois o excesso de lavagem no paciente sem sintomas pode remover o muco protetor da mucosa nasal. Caso o paciente esteja na crise de rinite ou com resfriado, situações que geram muitos sintomas nasais, o uso do soro fisiológico nasal deve ser abundante”.

 

Como a rinite alérgica pode afetar a qualidade de vida de um paciente?

“É incrível como a rinite é subdiagnosticada ou deixada de lado, pois só dá espirros e coriza. Eu lhes pergunto: como é a qualidade do sono de vocês quando estão com o nariz trancado? Vocês conseguem dormir? A obstrução nasal e os espirros não permitem um sono de qualidade com muitos despertares no meio da noite, causando cansaço durante o dia, déficit de memória e de concentração ou irritabilidade. Segunda situação: imagine-se dentro de um encontro social, seja no trabalho ou fora dele, como é a receptividade de uma pessoa que fica assoando o nariz o tempo todo? Quantos testes de COVID19 você acha que uma pessoa com rinite fez a mais que você”?

 

As alergias nasais se manifestam de maneira diferente em crianças comparadas aos adultos?

“Os sintomas são muito parecidos, com a diferença brutal que a criança não sabe recorrer aos vasoconstritores nasais (“gotinhas mágicas”) que o adulto compra e usa para alívio dos sintomas. É importante deixar claro que o uso dos vasoconstritores nasais não pode ultrapassar 5 dias, pois após isso pode levar a rinite medicamentosa, sangramento nasal, perfuração do septo nasal e, em doses altas, absorver no corpo e causar sintomas de palpitação, arritmia e aumento da pressão arterial”.

 

A rinite alérgica está relacionada a outras condições respiratórias, como asma ou sinusite crônica?

“O aeroalérgeno pode desencadear a doença no nariz (rinite), no pulmão (asma) e na pele (dermatite) e a associação das 3 doenças (rinite, asma e dermatite) é bem descrita como a curva da alergia. A rinite também pode desencadear outras doenças como a sinusite crônica. Além dos sintomas de espirros, coceira, coriza e entupimento nasal, o paciente pode ter sintomas de tosse, alteração do olfato, pressão facial e necessitar eventualmente de antibiótico por agudização da sinusite crônica”.

 

Como as diferentes estações do ano influenciam os sintomas da rinite alérgica?

“No Brasil, as estações do ano não são tão bem definidas como nos outros países não tropicais. É comum fazer frio na primavera ou no verão e é comum fazer calor no outono ou no inverno. Todas as árvores não ficam sem folhas no outono ou no inverno. E o pólen não aparece apenas na primavera. O que chama mais a atenção em cada estação é falta de chuva no inverno brasileiro (queda da umidade do ar interfere no bom funcionamento nasal e permite um maior tempo em suspensão no ar dos aeroalérgenos) e o rigoroso calor do verão que exige o uso do ventilador ou do ar condicionado quase que de forma contínua (contribuindo para a queda da umidade do ar)”.

 

Quais são os tratamentos mais promissores ou as pesquisas mais recentes na área de rinite e alergias nasais?

“A imunoterapia não é recente, mas as técnicas de aplicação se modernizaram, muitos pacientes optam pelo uso da imunoterapia sublingual, por exemplo. Importante ressaltar que a imunoterapia é reservada para os casos mais difíceis e que necessita de 3 a 5 anos para modular a resposta dos nossos anticorpos. O uso de imunobiológicos está indicado nos casos de sinusite crônica com pólipos nasais. Existem novos tratamentos surgindo como o uso da fotobiomodulação, mas que ainda não está inclusa como opção de tratamento nos consensos (europeu, americano ou brasileiro) de rinite alérgica, pois há a necessidade de mais estudos para a comprovação da técnica”. 

 

Que conselhos práticos o senhor daria para pacientes que sofrem de rinite alérgica?

“Capas e soro fisiológico nasal seriam os primeiros conselhos. Uma dica estratégica: caso perceba que a sua rinite ataca em algum ambiente específico (trabalho, casa do familiar, escola…), tome um comprimido de anti alérgico 1 hora antes de ir a esse ambiente específico, vai ajudar bastante. O paciente com rinite normalmente já conhece a maioria das estratégias, mas não as põe em prática. Agora, caso a resposta de antes já não seja a mesma, procure ajuda médica.

Colaboração: Allex Itar Ogawa, CRM- PR 27.178, Otorrinolaringologista, Professor da PUC Londrina.

 

*O conteúdo dessa matéria tem caráter informativo e não substitui a avaliação de Profissionais da Saúde.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do IstoÉ.