Dados da OMS (Organização Mundial de Saúde)¹, apontam que mais de 1 bilhão de pessoas no mundo são obesas –650 milhões de adultos, 340 milhões de adolescentes e 39 milhões de crianças. E esse número só aumenta. A OMS estima que até 2025, podemos chegar a 2,3 bilhões de adultos ao redor do mundo estejam acima do peso, sendo 700 milhões de indivíduos com obesidade.

O Atlas Mundial da Obesidade de 2023² aponta um crescimento exponencial da incidência de obesidade global. Somente entre os brasileiros, 41% da população adulta conviverá com a condição em 2035. Além disso, se a condição cresce anualmente entre os adultos (2,8%), durante a infância a aceleração é ainda mais intensa.

Esses dados são preocupantes, já que a OMS aponta há anos a obesidade como uma epidemia³ e um importante problema de saúde pública.

A obesidade é uma doença crônico-degenerativa e inflamatória caracterizada pelo acúmulo excessivo de gordura no tecido adiposo. A causa é multifatorial, ou seja, é consequência da alteração e/ou associação de múltiplos fatores genéticos, endócrino-metabólicos, psicológicos e ambientais. Tais fatores podem interferir no controle do balanço energético, que é a relação entre consumo e gasto energético.4

O excesso de gordura corporal aumenta o risco de uma pessoa desenvolver outras condições crônicas, como diabetes ou doenças cardíacas. Embora muitos fatores possam influenciar o desenvolvimento da obesidade —um acúmulo excessivo de tecido adiposo no corpo — os padrões alimentares e os níveis de atividade física são os principais contribuintes.

A relação entre o aumento do apetite e suas células cerebrais

Um estudo publicado na Cell Metabolism (2023)5 mostrou que  um grupo de células cerebrais são capazes de aumentar o apetite quando há um excesso prolongado de energia no corpo, como o acúmulo excessivo de gordura na obesidade.

Em modelos de obesidade em camundongos, os pesquisadores investigaram células no cérebro –neurônios que produzem NPY (neuropeptídio Y). O neuropeptídeo Y6 é um dos neuropeptídeos mais amplamente distribuídos no cérebro e desempenha um papel importante em várias funções fisiológicas, como o efeito orexígeno (estimulante do apetite) e suas ações na regulação neuroendócrina, especialmente na regulação da secreção de hormônios da hipófise anterior.  

Nosso cérebro tem mecanismos complexos que detectam quanto de energia está armazenada em nosso corpo e ajustam nosso apetite de forma proporcional. Uma maneira de realizar esse ajuste é por meio da molécula NPY, que o cérebro produz naturalmente em resposta ao estresse –como, por exemplo, a sensação de fome para estimular a alimentação. 

No modelo estudado, os cientistas descobriram que 15% das células cerebrais agiam de forma diferente em camundongos com obesidade e não eram capazes de interromper a produção de NPY em roedores com essa condição. Dessa forma, com o excesso de gordura corporal na obesidade, o NPY continua a aumentar o apetite mesmo em níveis baixos.

Os pesquisadores descobriram que essas células não apenas produziam a molécula estimulante do apetite NPY, mas também tornavam o cérebro mais sensível à molécula, aumentando ainda mais o apetite. Essas células iniciam mudanças no cérebro que o tornam mais sensível até mesmo a níveis baixos de NPY quando há um excesso de energia no corpo na forma de excesso de gordura.

De forma resumida, em condições de excesso de gordura corporal, o apetite pode ser impulsionado principalmente pelo NPY produzido por esse subconjunto de neurônios. Essas células não apenas produzem NPY, mas também sensibilizam outras partes do cérebro para produzir receptores adicionais ou “estações de ancoragem” para a molécula, aumentando ainda mais o apetite.

Os pesquisadores pontuam que é um ciclo vicioso que interrompe a capacidade do corpo de equilibrar sua entrada de energia com o armazenamento de energia, aumentando o desenvolvimento da obesidade.

Como o cérebro resiste à perda de peso

Nosso cérebro está preparado para resistir à deficiência de energia ou à perda de peso, pois entende isso como uma ameaça à nossa sobrevivência e ativa mecanismos que aumentam nosso apetite para que procuremos comida. Como explorado no estudo, isso ocorre mesmo quando temos excesso de energia armazenados no corpo.

Os estudiosos dizem que a descoberta abre a possibilidade de bloquear os receptores adicionais e mais sensibilizados para o NPY como uma nova abordagem para o desenvolvimento futuro de medicamentos para combater a obesidade.

A descoberta nos ajuda a entender melhor os mecanismos no cérebro que interferem com um metabolismo energético equilibrado e como eles podem ser direcionados para melhorar a saúde.

Entretanto, enquanto a os cientistas buscam soluções pontuais e promissoras, sabemos que pacientes com obesidade, com uma média de 100 kg, expostos à intervenção interdisciplinar para o emagrecimento, com a prática de exercícios que melhorem a quantidade de massa magra, alimentação saudável (in natura) e apoio psicológico para melhora de comportamento; com a perda de, aproximadamente, 10 quilos, ou seja, 10% do seu peso inicial, podem retornar a sua concentração normal de NPY.7 

Por isso, sempre busque uma melhora da qualidade de vida, porque com certeza é o caminho para o sucesso. 

*O conteúdo dessa matéria tem caráter informativo e não substitui a avaliação de Profissionais da Saúde.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do IstoÉ.

Referências Bibliográficas

¹WHO. World Obesity Day 2022 – Accelerating action to stop obesity. Disponível em: https://www.who.int/news/item/04-03-2022-world-obesity-day-2022-accelerating-action-to-stop-obesity
²Atlas da Obesidade. Disponível em: https://pt.worldobesityday.org/resources/entry/world-obesity-atlas-2023
³WHO. Controlling the global obesity epidemic. Disponível em: https://www.who.int/activities/controlling-the-global-obesity-epidemic
4WHO. Obesity. Disponível em: https://www.who.int/health-topics/obesity#tab=tab_1
5Yue Qi, Nicola J. Lee, Chi Kin Ip, Ronaldo Enriquez, Ramon Tasan, Lei Zhang, Herbert Herzog. Agrp-negative arcuate NPY neurons drive feeding under positive energy balance via altering leptin responsiveness in POMC neurons. Cell Metabolism, 2023; DOI: 10.1016/j.cmet.2023.04.020
6ScienceDirect. Neuropeptide Y. Disponível em: https://www.sciencedirect.com/topics/neuroscience/neuropeptide-y
7Dâmaso, A. Nutrição e exercício na prevenção de doenças. Segunda edição. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan. 2012.